Eu não sou uma psicóloga licenciada
by Anne Isabelle
aviso de gatilho: suicídio
Eu não sou uma psicóloga licenciada. Sou uma amiga. Me trate como tal.
Todos estamos em algum tipo de sofrimento, especialmente psíquico. Estamos cada vez mais ansiosos, deprimidos, lidando com mais e mais transtornos mentais decorrentes do capitalismo tardio. Suicídio, por exemplo, se torna um pensamento constante nas mentes de muitíssimas pessoas. O sentimento de que a vida não vale nada, de vazio existencial, toma nossa cabeça de assalto a todo momento e não deixa espaço para quase mais nada.
Eu tenho praticado mais a escuta ativa – fazer com que meus amigos se sintam confortáveis em conversar comigo sobre tópicos delicados, muitas vezes tabu e com muito julgamento. Tenho reconhecido também minhas crenças, meu senso ético, meus limites, meus pensamentos disfuncionais, minhas fortalezas e fraquezas e em como eu quero viver minha vida.
Além disso, eu gosto de compartilhar experiências e que as pessoas compartilhem suas experiências comigo. Todos que me conhecem sabem que sou autista, trans, tenho transtorno bipolar e sou não monogâmica. Que tá tudo bem falar de saúde mental comigo pois tenho muita coisa muito complexa pra conversar sobre.
Porém, eu aprendi a estabelecer e respeitar um limite extremamente importante – eu não sou uma profissional da saúde mental. Sou apenas uma pessoa que viveu algumas coisas e que lê muito e fala muito. Não sou tão diferente de qualquer pessoa que dá pitacos e conselhos.
Muito se fala do Setembro Amarelo e de como salvaríamos vidas se “identificássemos os sinais” ou “perguntássemos se alguém está bem”. Parece que o mercado de wellness conseguiu convencer a gente de que o suicídio é um problema nosso, que, se nos esforçarmos, ninguém smt.
Isso é extremamente pesado. E doloroso.
Se alguém é culpado pelo autoextermínio de alguém, esse alguém, ou esse conjunto de alguém, é o sistema. A burguesia, que explora todo mundo até o último gole. O governo que corta fundos do SUS e que não consegue suprir a demanda por psicólogos e psiquiatras e que coloca pessoas em sofrimento em eterna burocracia pra conseguir atendimentos no CAPS ou na UBS.
Se você já pensou em suicídio, ou infelizmente teve lidar com a partida de alguém por isso, a culpa não é sua por não ter ouvido, ou por não ter perguntado. Não, a culpa provavelmente foi de uma empresa, de algum pastor, da nossa sociedade preconceituosa, etc.
Eu aprendi que algumas coisas são melhores ditas a profissionais. Psicóloga, psiquiatra. Por mais que eles não sejam ainda deuses da saúde mental, eles são treinados pra lidar com o trauma de ouvir trauma dumping de outras pessoas. Eu não sou, você não é.
Enfim, bora tirar da nossa cabeça essa ideia de wellbeing washing que a firma colocou na nossa cabeça e buscar terapinha. Eu sei que é difícil, especialmente quando não se tem grana para isso. É por isso que apoio programas como o SaMeCa – pra que todes possam ter acesso a auxílio de saúde mental de qualidade!
Ciao.
tags: